Carta a Ilhéus

Geraldo Lavigne de Lemos
Divulgação

Ilhéus, estou aqui, um dos seus,

filho de sua filha, plaga de sua plaga,

parte da Capitania.

 

Onde seu reino se instala,

                                 não se apaga,

pois suas terras, como eu disse,

são sangue do nosso sangue,

sem distinção entre natos e naturalizados.

 

Venho rogar pelos nossos dias. E venho anotar,

também, o meu alistamento; ao qual, respondo

sem hesitar.

 

Valho-me do jus soli,

dos meus ancestrais que estão em seus cemitérios,

do suor deles e do meu, que caíram sobre as suas terras;

 

valho-me do jus sanguinis,

do nosso sangue mestiço;

 

valho-me das vitórias por Nossa Senhora,

dos colonos aqui radicados, dos migrantes,

do nosso sangue estrangeiro;

 

valho-me dos bravos nadadores assassinados,

dos aimorés, das tribos expulsas,

do nosso sangue indígena;

 

valho-me do levante do Engenho de Sant’Ana,

da resistência escrava, dos quilombos,

do nosso sangue negro;

 

e dirijo-lhe esta oração:

 

Ó, Ilhéus, terra mãe,

conduza-nos ao futuro.

Ajude-nos a salvar a sua memória,

ecoar os acertos e não reiterar os erros.

Em um ambiente de paz e fraternidade,

dê-nos gana sem ganância.

Você, que é anciã, de sabedoria secular,

ensine-nos sobre igualdade e respeito.

Que, nesse porvir, tenhamos o mínimo existencial,

para que cada cidadão seu tenha uma vida digna.

Que a infância seja protegida;

            a juventude, alimentada;

                   e a velhice, acolhida.

Que não falte ocupação aos adultos, nem amparo na falta.

Que, na escassez, haja partilha; e, na fartura, prudência.

Que as futuras gerações frequentem boas escolas,

desfrutem da natureza e se preocupem com as que virão;

e que encontrem em você um lar,

amando-lhe, como nós, hoje, amamos.

 

Poema "Carta a Ilhéus", escrito por Geraldo Lavigne de Lemos em 2017, publicado no livro "Poética da Existência" (Editora Patuá, 2019) e revisado em 2020.

O autor Geraldo Lavigne de Lemos é advogado, trabalha em São Paulo. É também considerado um grande poeta da nova geração, publicado nas mídias e veículos mais conceituadas da literatura contemporânea. Tem muitos livros publicados. É membro da Academia de Letras de Ilhéus onde ocupa a Cadeira 23, cujo Patrono é Guttemberg Berbert de Castro, do fundador Ramiro Berbert de Castro. É sucessor de Mário de Castro Pessoa.